Lazarus almeja ser épico e filosófico, mas termina fragmentado entre ambição e execução
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Em um futuro próximo, a humanidade vive uma era de paz sem precedentes, graças a uma droga chamada Hapna que elimina todo sofrimento. No entanto, o seu criador, Dr. Skinner, regressa três anos depois de ter desaparecido para revelar uma verdade aterradora: a droga é, na realidade, um veneno que matará toda a população em três anos. Para salvar o mundo, uma equipa de elite é reunida para encontrar o Dr. Skinner.
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Em Lazarus, Shinichirō Watanabe parece enfrentar um dilema que ecoa o próprio tema da série: o embate entre o ideal e a limitação material.
O projeto prometia unir filosofia e espetáculo em uma ficção científica de alta energia. O resultado, porém, revela-se desigual. Um anime que aspira à complexidade de Cowboy Bebop e à fisicalidade do cinema de ação moderno, mas que termina aprisionado em sua própria indecisão formal.
É evidente que Lazarus precisava de mais tempo, e sobretudo de mais orçamento, para amadurecer. Existem boas ideias pontuais, vislumbres de um universo promissor e momentos em que a abordagem atinge breves lampejos de inspiração.

Mas o conjunto se impõe como um trabalho inacabado, tanto narrativamente quanto tecnicamente. O ritmo irregular denuncia um processo de produção apressado, e a ausência de um pulso emocional constante impede que as tramas episódicas encontrem ressonância.
Alguns episódios até se arriscam em estruturas mais autônomas, adotando uma melancolia episódica que remete à tradição do space western de Watanabe, histórias que funcionam como pequenas elegias de solidão e deslocamento.
No entanto, aqui, os personagens carecem da densidade que tornava Spike Spiegel ou Faye Valentine inesquecíveis. Axel, Eleina e Chris são figuras esboçadas, mais próximas de modelos de uma aventura genérica do que de personagens realmente vividos.
Ainda assim, é possível reconhecer um esforço sincero de equilibrar introspecção e aventura. O anime tenta articular o drama interno dos protagonistas – traumas de infância, perdas e culpas – com “missões” que traduzem dilemas morais e afetivos.
Essa tensão entre o gesto e o sentimento reprimido, entre a ação e a memória, ecoa os princípios que Watanabe explorava em Cowboy Bebop: a ação como prolongamento de um vazio emocional.

Mas Lazarus vacila justamente no ponto de encontro entre essas forças. Watanabe parece dividido entre duas intenções, fazer um anime acessível, direto, de apelo comercial, e ao mesmo tempo preservar uma profundidade autoral e filosófica.
O resultado é um meio-termo frágil. O espetáculo nunca se impõe de fato, e o drama raramente comove. A série recua sempre um passo antes de se arriscar, domesticando a própria ambição.
As tentativas de inserir comentários políticos sobre inteligência artificial messiânica, vigilância digital e colapso ambiental soam particularmente frágeis. São temas potencialmente ricos, mas apresentados como slogans genéricos, destituídos de dramatização real.
Lazarus fala sobre um “futuro consciente”, mas o faz com o tom didático e vazio de uma campanha de marketing corporativo. Falta à série o impulso poético que transforma tese em metáfora e argumento em imagem.

A presença de Chad Stahelski é perceptível nas coreografias de combate. As lutas buscam um senso de corpo no espaço, trabalhando o cenário como extensão do movimento. Existe uma intenção de criar uma dança física, precisa, quase coreográfica. A sequência de fuga inicial de Axel é exemplar nesse sentido: o corpo age com ritmo, peso e propósito.
No entanto, a execução técnica raramente acompanha a ambição. Muitos planos sofrem com a má integração entre personagens e fundos digitais, um problema recorrente em produções apressadas da Mappa.
O resultado são cenas planas, sem densidade luminosa, e movimentos que perdem impacto. Algumas lutas – como a do elevador no episódio 5 – dão a impressão de flutuar, sem inércia ou gravidade, possivelmente devido a ausência de quadros intermediários adequados. É o tipo de falha que dilui o realismo do movimento, transformando o que deveria ser ação em um balé sem peso.

Lazarus é, em essência, uma obra sobre hesitação. Quer ser elegante e brutal, filosófica e pop, mas termina prisioneira de uma indecisão estética e narrativa. O anime ensaia uma grandeza que nunca se realiza por completo, como se a própria animação estivesse a um passo de se tornar imagem viva, mas permanecesse presa ao esboço.
Existem, sem dúvida, momentos de beleza e invenção, lampejos que lembram o olhar autoral de Watanabe. Mas entre a aspiração e a execução, o que prevalece é o vazio de um projeto que sonha com transcendência, mas acorda exausto.
