NOITES BRUTAIS (2022): Entre o cult e o gore

Ao tentar conciliar tradições distintas do terror, o filme revela uma abordagem irregular

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Noites Brutais tem momentos bem interessantes quando contextualiza seus ambientes e apresenta a sua premissa. O longa, assim como Sorria (2022), parece seguir uma tendência atual do terror de conciliar elementos formais sóbrios e minimalistas com uma abordagem mais explícita e gore.

Nesse caso, isso dita até mesmo a estrutura espiral do filme. Ele começa como um suspense psicológico, sugere algo mais explícito no final do primeiro ato e, logo depois, volta para um suspense mais sugestivo envolvendo o personagem de Justin Long. Apenas no ato final propriamente é que tudo descamba para algo realmente mais gráfico e brutal, como se o filme fosse sempre adiando esse momento.

O diretor até usa bem o suspense e o terror psicológico para criar uma atmosfera sugestiva antes do ato final. Ele integra essa proposta de modo interessante com a realidade urbana de Detroit e com uma sensação de submundo velado, mas o longa é bastante genérico quando de fato precisa resolver o que propõe.

É um terror moderninho que é competente quando se limita a ser moderninho, quando se limita apenas a “sugerir” coisas e criar uma atmosfera, mas que não sabe o que está fazendo quando quer pegar pesado.

O principal problema está no fato de que, quando a obra aborda aspectos mais violentos, ela para de se levar a sério. As cenas atmosféricas possuem um cuidado tanto formal como dramático bem característico enquanto que o ato final, envolvendo uma espécie de monstro, é tratado com descaso.

Até existem acontecimentos absurdos no final que poderiam soar espirituosos (principalmente quando os personagens saem da casa e a narrativa praticamente desiste de parecer verossímil), mas são coisas que, simplesmente, são muito deslocadas entre si. O filme perde muito da sua unidade quando tenta dar conta desses dois universos.

Nesse caso, é diferente de Sorria (2022), que também sugere essa integração de um terror lento com um terror old school, mas lida com essas duas dimensões com a mesma disposição. Do início ao fim, mesmo nas cenas clichês, Sorria (2022) possui uma seriedade e uma mesma concepção formal e cuidado.

No caso de Noites Brutais, temos a impressão que o diretor desmerece o lado gore. Ele faz ali o seu filme modernoso durante 1 hora, mostra que sabe ser “profundo” e sugestivo com o que tem em mãos, e no momento em que o trabalho se torna um filme de gênero convencional, desiste disso e dá a entender que a violência absurda e algumas referências furadas já se bastam.

A pegada cult, mesmo que com bons momentos, funciona mais como uma forma de justificativa do que algo que contribui na construção de um olhar completo. O flashback que explica as circunstâncias da ameaça no porão da casa é um bom exemplo de outro momento artsy (a grande angular e o “ângulo Gaspar Noé” reforçam o lado cult de fachada) que soa exibicionista.

É inegável que, em teoria, o longa é uma boa proposta contemporânea de desconstrução, já que no final ele rejeita os artifícios sóbrios que usa no início. Infelizmente não consegue encontrar um meio de conectar essas duas representações e expõe as suas intenções de modo bem genérico e até esnobe.