LUTA DE CLASSES (2025): Entre a ambição e a dispersão

Spike Lee entrega um filme irregular, marcado por experimentações sem método e raros momentos de intensidade

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Após o sequestro de um jovem, o caso expõe tensões sociais profundas, colocando frente a frente um magnata do mundo da música (Denzel Washington) e um jovem rebelde (A$AP Rocky) em um confronto de valores e visões de mundo. O filme é uma refilmagem do clássico Céu e Inferno (1963), de Akira Kurosawa.

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O mais recente trabalho de Spike Lee, Luta de Classes (2025), revela-se uma experiência cinematográfica irregular, marcada por uma abertura desastrosa e por lampejos ocasionais de vigor dramático.

A primeira parte do filme é bastante problemática. As cenas parecem existir de maneira autônoma, sem articulação rítmica ou fluidez narrativa, como se estivéssemos diante de um encadeamento mecânico de diálogos e situações.

As falas soam isoladas, mais próximas de exercícios de mesa de leitura do que de uma encenação acabada, o que compromete a progressão dramática.

A trilha sonora, insistente e repetitiva, atua menos como elemento de intensificação e mais como obstáculo, funcionando quase como uma tortura intermitente que tenta forçar um suspense inexistente.

Esse conjunto inicial transmite a sensação de um ensaio mal costurado, em que a forma cinematográfica ainda não encontrou coesão.

Na segunda parte, existe uma melhora perceptível, sobretudo quando Lee concentra a narrativa em um confronto mais direto entre os personagens de Denzel Washington e A$AP Rocky.

Essa opção, em teoria, representa uma subversão interessante do caráter procedural presente no filme original de Kurosawa – ao invés de investir em uma progressão pautada pelo acúmulo de depoimentos e informações, Lee escolhe destacar o embate dramático como núcleo da ação.

Nesse ponto, a cena ambientada no estúdio surge como um dos raros momentos em que o filme ganha densidade. Washington demonstra pleno domínio de cena, e a tensão entre os dois atores flui com naturalidade, revelando o potencial que o filme poderia ter explorado com maior constância.

Porém, tais acertos se apresentam como pontos isolados em meio a um conjunto marcado pela arbitrariedade.

Isso também se evidencia nas escolhas estéticas ligadas à fotografia. O uso de diferentes texturas – alternando entre filmagens em 16mm e 8mm – sugere um gesto de experimentação, mas carece de um princípio organizador.

Ao contrário do método que Tony Scott imprimia em suas desconstruções pictóricas, potencializando a tensão através da fragmentação visual, Lee parece inserir as imagens cruas em 8mm de maneira brusca, quase aleatória, sem que tais mudanças resultem em potência dramática ou simbólica.

Luta de Classes, portanto, oscila entre a promessa de um diálogo instigante com o cinema clássico e a frustração de não alcançar uma forma consistente. Se a cena entre Denzel e A$AP Rocky deixa entrever um cinema pulsante, comprometido com a fricção entre visões e ideias, o restante da obra se dilui em uma colagem irregular, incapaz de sustentar a ambição proposta.