AMORES MATERIALISTAS (2025): A fragilidade dos afetos

Entre a promessa da sofisticação e o esvaziamento formal, Celine Song busca subverter a comédia romântica

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Lucy é uma casamenteira bem-sucedida em Nova York, mas sua vida amorosa se complica. Ela se encontra em um triângulo amoroso entre um empresário rico e um ex-namorado do passado, um garçom com sonhos de ser ator. O filme explora a difícil escolha entre o amor e o dinheiro.

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Em Amores Materialistas, Celine Song procura tensionar os limites da comédia romântica ao revestir uma estrutura clássica do gênero com um tom contemplativo, quase existencial.

Sua ambição é clara, negar soluções fáceis e afastar-se das convenções narrativas previsíveis, em favor de um cinema que se pretende mais denso e desolador. O projeto, ao menos em seu princípio, sugere uma tentativa de renovação estética e temática dentro de um gênero tradicionalmente marcado por fórmulas.

Nas primeiras sequências, especialmente nas interações entre os personagens de Dakota Johnson e Pedro Pascal, percebe-se a força desse gesto. A diretora desacelera o ritmo natural dos diálogos, que poderiam facilmente escorregar para a ironia ligeira ou para a agilidade cínica típica das comédias românticas contemporâneas.

Ao dilatar o tempo, Song cria uma atmosfera de letargia que transforma cada troca verbal em um espaço de estranhamento íntimo. Essa escolha formal não apenas introduz uma inesperada intensidade dramática, como também revela a engrenagem fria das relações afetivas no mundo urbano..

É nesse ponto que o filme se mostra mais instigante do que Vidas Passadas (2023). Enquanto o longa anterior de Song se apoiava em uma poética de memórias e reencontros idealizados, Amores Materialistas busca uma formalidade própria, menos interessada em romantizar o passado e mais voltada a expor a aridez das relações no presente.

Essa recusa do lirismo genérico é uma das marcas mais fortes do filme, pois abre brechas para um drama íntimo que, ao menos no primeiro ato, parece promissor.

No entanto, essa promessa não se sustenta ao longo da narrativa. Após a ruptura entre os personagens de Johnson e Pascal, os conflitos subsequentes soam artificiais, como se fossem encenados para cumprir a cartilha de um drama autoral contemporâneo.

A atmosfera “reveladora” que o filme tenta impor – uma calmaria capaz de transformar o banal em transcendência – raramente encontra correspondência na direção de atores ou na construção estética. O resultado é uma segunda metade esvaziada, em que a contemplação se converte em superfície apagada, incapaz de gerar densidade dramática.

A fotografia em 35mm é utilizada de modo mais rústico e cru. Não existe um fetiche pela textura fílmica nem o desejo de um “look indie” estilizado; a película se integra organicamente à luz natural e aos cenários impessoais que atravessam a narrativa.

Essa textura áspera cumpre uma função simbólica relevante, funcionando como analogia visual para os impasses internos das personagens, cuja fragilidade se desenha justamente em meio a ambientes indiferentes. Nesse aspecto, o filme alcança momentos pontuais consistentes ao articular materialidade estética e estado emocional.

Ainda assim, o saldo final é de desequilíbrio. Amores Materialistas exibe lampejos de sofisticação formal e ensaia um deslocamento interessante das convenções do gênero, mas não consegue sustentar a densidade que propõe.

A contemplação almejada não se traduz em transcendência, e o gesto de “subverter” a comédia romântica acaba cedendo ao peso de uma dramaturgia pouco orgânica. O que poderia ser uma reflexão contundente sobre os afetos em tempos de mecanização urbana termina como uma obra que ilustra mais suas intenções do que as realiza.