O BRUTALISTA (2024): Épico ilustrativo

Brady Corbet propõe abordagem disruptiva que nunca encontra um método

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O arquiteto László Toth, sobrevivente do Holocausto, foge da Europa para tentar reconstruir sua vida nos Estados Unidos. Ele se estabelece na Pensilvânia e se envolve em um projeto ambicioso de um proeminente industrial.

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A AUSÊNCIA DE UM MÉTODO

É interessante como O Brutalista retrata a marginalização de um personagem judeu sobrevivente do Holocausto e problematiza os Estados Unidos pelo modo como os americanos o tratam e pela maneira como o protagonista nunca acessa, de fato, o “sonho americano”.

Além de não ser um filme óbvio sobre os efeitos da guerra, ele parece disposto a evidenciar até mesmo certas contradições e defeitos de seus personagens, incluindo o próprio protagonista.

Nesse ponto, a construção de László Tóth lida bem com um certo equilíbrio entre evidenciar seu sofrimento e, ao mesmo tempo, não ser totalmente paternalista com ele.

O grande problema do filme, porém, é que, na execução dessa premissa, o diretor Brady Corbet está mais interessado em um certo efeito épico e sensorial imediato das cenas do que em uma construção dramática que de fato revele um olhar pessoal sobre essa proposta.

O longa parte de uma abordagem clássica na forma como se estrutura e, ao que tudo indica, possui um roteiro com uma dramaturgia bastante tradicional nesse ponto. Mas o diretor, por outro lado, parece se inspirar em cineastas como Terrence Malick e Andrew Dominik para que várias cenas se tornem pequenos acontecimentos audiovisuais disruptivos.

Em teoria, não há nada de errado nisso. A questão é que, além de Corbet ser menos criativo do que Malick e Dominik, o filme entra em uma espécie de descompasso à medida que intercala, sem qualquer método específico, uma abordagem convencional na apresentação de suas situações e uma abordagem pretensamente experimental na desconstrução dessas mesmas situações.

O cineasta quer se aproveitar dos apelos dessas duas abordagens, mas nunca faz escolhas específicas que trariam maior unidade ao seu trabalho.

Ele nunca deixa, por exemplo, a abordagem mais livre contaminar a estrutura engessada da narrativa, como acontece nos melhores filmes de Malick; e também nunca permite que os elementos clássicos imponham um rigor às suas viagens sensoriais, como acontece, por exemplo, em grandes filmes como Sangue Negro (2007) ou Pacifiction (2022).

Desse modo, O Brutalista se resume a uma boa premissa com uma execução genérica, que tenta emular um cinema mais livre, mas acaba simplesmente tornando a experiência do filme bagunçada.

Na primeira parte, até existem bons momentos em que essa abordagem disruptiva traz certa espontaneidade para as cenas, como, por exemplo, quando László interage com outros personagens e explora o país onde acaba de chegar.

Já a segunda parte, muito mais travada e de montagem pouco fluida, possui sequências que mais parecem blocos de acontecimentos isolados e arbitrários, que mal se conectam entre si.

São cenas que tentam dar conta de um drama pesado a partir das atitudes autodestrutivas do protagonista, mas que soam extremamente forçadas e perdem qualquer espontaneidade presente na primeira parte.

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UMA FALSA ESTÉTICA ARTESANAL

A textura do 35 mm do filme, filmado em VistaVision (um formato inventado pela Paramount nos anos 50 que dispõe o negativo 35 mm na horizontal para atingir uma janela widescreen), até lembra o modo como Paul Thomas Anderson trabalha com o aspecto artesanal da película a partir de uma perspectiva épica em Sangue Negro (2007).

Mas, enquanto Sangue Negro (2007) é um filme que parte desse trabalho virtuoso com a película para atribuir rigor e método à obra (especialmente na forma como relaciona personagens e cenários de modo opressivo), Brady Corbet se utiliza da película de maneira superficial.

No lugar do rigor, o cineasta constantemente “brinca” com os movimentos de câmera e cortes, a fim de que suas cenas possuam meros estímulos extras. É como se o próprio diretor não confiasse na força do drama encenado e seguisse essa lógica de impulsos constantes para tornar a cena pretensamente mais vibrante.

E, novamente, ele faz isso sem um método aparente. Por exemplo, no diálogo entre os personagens de Adrien Brody e Guy Pearce, fumando em uma sala de estar — logo antes de o personagem de Pearce fazer o convite para que o protagonista projete o instituto que deseja construir —, a cena começa com um simples plano e contraplano dos dois atores.

De repente, o longa insere planos completamente aleatórios e pretensamente sensoriais — outros personagens, ações em slow motion e imagens do ambiente da mansão — no meio dessa conversa.

Como o diretor é incapaz de filmar uma simples conversa de modo estimulante e não possui um método específico para desconstruir aquelas imagens, ele simplesmente insere planos mais estilizados no meio da cena.

Esse mesmo processo se repete em várias outras sequências. A estética artesanal do VistaVision é reduzida a planos e cortes que apenas sobrecarregam uma decupagem pouco criativa e genérica.

Para um filme que deseja reforçar a importância de seus ambientes, Brutalista se resolve muito mal nas relações visuais entre personagens e cenários que tenta estabelecer.

O diretor geralmente filma diálogos de modo convencional (seja por uma lógica de plano e contraplano, seja com uma simples câmera na mão que segue o elenco) e intercala isso com planos gerais grandiosos e pseudo-virtuosos ou com imagens estilizadas de teor mais experimental.

O filme é incapaz de integrar essas duas abordagens e, por isso, sua experiência estética se torna meramente ilustrativa, enquanto sua experiência dramática se revela apenas cansativa.