Um slasher é um filme em que um assassino persegue e mata um grupo de pessoas se utilizando de algum objeto com lâminas (como uma faca, um machado ou uma motosserra). A partir dos anos 70, o slasher se tornou um dos subgêneros mais famosos do terror.
Existem várias obras antigas que remetem à ideia de um assassino em série e que possuem estruturas similares às dos slashers.
André De Toth, por exemplo, aborda o assassino de Museu de Cera (1953) como alguém que ritualiza as mortes. Um requinte sádico que pode ser percebido em futuros filmes do terror slasher, já que são obras que, do mesmo modo, tendem a espetacularizar a morte.
.
O SLASHER E O TERROR MODERNO
Nos ano 60, com o lançamento de filmes como A Tortura do Medo (1960) e Psicose (1960), além de outras obras modernas envolvendo temas obscuros com uma abordagem psicológica bem construída, o terror passa a ser levado mais a sério de um modo geral.
Obras como A Noite dos Mortos-Vivos (1968), por sua vez, integram o realismo do suspense com aspectos mais gráficos do terror, o que também será explorado pela tendência do slasher.
Os filmes que seguem uma tradição do Giallo começam a surgir nessa década e, igualmente, contribuem tanto para uma maior legitimação artística do terror como também para algumas futuras marcas do slasher.
Embora existam filmes de assassinos em série desde o início do cinema, a partir dos anos 70 alguns cineastas desenvolvem uma fórmula que segue convenções específicas que viriam a se tornar convenções do slasher.
Podemos destacar Mansão da Morte (1971), O Massacre da Serra Elétrica (1974), Noite do Terror (1974) e Halloween – A Noite do Terror (1978) como trabalhos essenciais de uma fase clássica desse subgênero.
.
MANSÃO DA MORTE (1971) – MARIO BAVA
Mansão da Morte é considerada por muitos como a obra fundadora do slasher.
O plot gira em torno da disputa pela propriedade de uma baía e envolve uma série de assassinatos cometidos por diferentes personagens. No decorrer do filme, um grupo de jovens sem relação com essa disputado também são mortos
É interessante como, no filme de Bava, não existe apenas um vilão, mas vários personagens assassinos. Em certos momentos, somos surpreendidos por essa variação.
O diretor dedica-se de forma especial à construção das cenas de mortes. Os assassinos usam diferentes objetos e formas para matar, chegando a um ponto tão radical que as mortes tornam-se efêmeras e a obra, de maneira muito instigante, aborda uma certa violência gratuita. O modo como o cineasta encerra o filme evidencia essa provocação.
Apesar do filme não seguir as convenções exatas do slasher, esse trabalho foi uma grande influência para o surgimento do subgênero.
.
O MASSACRE DA SERRA ELÉTRICA (1974) – TOBE HOOPER
Mais do que um simples precursor, O Massacre da Serra Elétrica foi um dos primeiros filmes a estabelecer algumas “regras” do slasher.
O filme conta a história de dois irmãos que viajam com amigos para verificar o túmulo de seu avô, que pode ter sido vandalizado. No trajeto, eles param em uma casa abandonada que pertenceria à família e, nos arredores dessa casa, deparam-se com um assassino.
O personagem, que cobre a face com uma máscara feita de pele, utiliza objetos laminados como armas, incluindo uma motosserra. No final, a única sobrevivente entre os jovens é a irmã, que é capturada, mas consegue fugir.
Tobe Hooper define convenções clássicas do subgênero e por isso acabou sendo uma influência mais famosa do que Mario Bava.
Algumas dessas convenções incluem: um assassino mascarado que sofre de um distúrbio, um objeto laminado que, além de ser uma arma, é também parte da identidade desse assassino, e uma final girl.
Final girl é um termo criado pela teórica Carol J. Clover para definir a mocinha mais inocente da história e que acaba sobrevivendo aos acontecimentos de um slasher.
O Massacre da Serra Elétrica foi filmado em película 16mm, o que dá uma aparência crua ao filme. E apesar de ter uma decupagem realista, o diretor também faz planos estilizados, principalmente pelo modo que se apropria da luz natural em alguns momentos e em como coloca a câmera em ângulos baixos em cenas específicas.
.
NOITE DO TERROR (1974) – BOB CLARK
Outro filme do início dos anos 70 em que podemos reconhecer certas convenções do slasher é o canadense Noite do Terror (1974), de Bob Clark.
A obra conta a história de um grupo de garotas que mora em uma república e recebe ligações intimidadoras. Elas passam a ser perseguidas e mortas durante o feriado de Natal.
Um dos aspectos mais marcantes desse trabalho é o emprego do ângulo em ponto de vista para identificar o olhar do assassino. Quando filma dessa maneira, o diretor deforma a imagem com uma lente grande angular para que o campo de visão seja maior.
Essa técnica do ponto de vista do assassino, apesar de não ser nova, se torna uma marca em vários filmes slasher. A primeira cena de Halloween – A Noite do Terror (1978), de John Carpenter, é uma das mais icônicas nesse sentido.
.
HALLOWEEN – A NOITE DO TERROR (1978) – JOHN CARPENTER
Halloween – A Noite do Terror começa com um garoto chamado Michael matando sua irmã na noite de Halloween. Após esse acontecimento, ele passa anos internado em um manicômio, consegue fugir e volta a sua cidade natal no dia do Halloween. Lá, ele passa a perseguir Laurie Strode (a final girl da franquia) e seus amigos.
O filme de Carpenter se parece mais com O Massacre da Serra Elétrica (1974) pela forma como é direto em sua abordagem, sendo menos dramático do que Noite do Terror (1974). O diretor resolve muito bem as sequências com os poucos elementos que tem (tudo se passa em praticamente duas casas).
Na ambientação da obra, a aparência de tranquilidade das casas de subúrbio é subvertida pelos acontecimentos macabros. Essa ameaça a um espaço familiar privado e pretensamente protegido também se torna uma convenção do slasher.
.
O MOMENTO HISTÓRICO DOS ESTADOS UNIDOS
Alguns teóricos estabelecem O Massacre da Serra Elétrica (1974), Noite do Terror (1974) e Halloween – A Noite do Terror (1978) como a trilogia essencial do slasher. Estes seriam os filmes que, oficialmente, dão origem ao gênero.
Um autor como Sotiris Petridis, por exemplo, categoriza os três longas como obras que pertencem à fase clássica do subgênero por sintetizarem suas principais convenções.
Depois do lançamento desses três filmes, o subgênero cresce muito. Alguns estudiosos relacionam o sucesso da tendência – e mesmo algumas de suas motivações temáticas – ao momento histórico pelo qual o Estados Unidos passava.
Na época, o país era governado pelo conservador Ronald Reagan. O moralismo de certos filmes, como por exemplo o fato de personagens promíscuos morrerem antes, pode ter origem nesse contexto. Além disso, a ameaça da AIDS nos anos 80 gera um clima de alienação envolvendo comportamentos sexuais. Algo que também pode ter relação com uma ideia de punição bastante presente nesses filmes.
.
O DESGASTE DA FÓRMULA
Após o lançamento dessas obras nos anos 70, a fórmula do slasher passa a ser muito utilizada durante os anos 80. O que gera um desgaste muito grande para o subgênero.
As convenções do slasher passam a ser tratadas de modo genérico por alguns filmes que buscavam apenas surfar na onda dessa tendência. Sendo assim, boa parte do público fica enjoado dessa fórmula.
.
O SLASHER AUTOCONSCIENTE
Nos anos 90, surgem filmes que fazem referência às obras mais clássicas do slasher dentro de uma abordagem metalinguística. O Novo Pesadelo: O Retorno de Freddy Krueger (1994) é um dos mais marcantes nesse sentido.
No filme, a atriz do primeiro e do terceiro filmes da franquia de Freddy Krueger é convidada para estrelar um novo longa com o vilão, mas Freddy começa a aparecer para ela na vida real.
O diretor de O Novo Pesadelo, Wes Craven, também atua no longa como si próprio. Sua participação mostra ao público o processo de produção de um filme. Em uma cena, a atriz lê o roteiro do próprio filme ao qual estamos assistindo, reforçando o aspecto metalinguístico da obra.
Essa abordagem autoconsciente de Wes Craven sobre o slasher ficaria realmente famosa nos filmes da franquia Pânico (1996-2011). Em tais obras, os personagens conhecem e descrevem as convenções do slasher, e o diretor ainda insere uma franquia de filmes dentro da franquia Pânico, chamada Stab.
Outros longas, como Halloween H20: Vinte Anos Depois (1998), possuem flertes reveladores para o passado. Em uma das cenas mais icônicas do filme, Jamie Lee Curtis contracena com Janet Light, a atriz de Psicose (1960) e sua mãe na vida real. A cena funciona como um vínculo simbólico dessa tradição.
.
REMAKES E O SLASHER CONTEMPORÂNEO
Na primeira década dos anos 2000, surgem remakes dos filmes da era clássica do slasher na tentativa de cativar um público jovem a partir das mesmas premissas. As refilmagens são menos espontâneas que os filmes originais porque, muitas vezes, possuem um interesse somente comercial.
Em relação a slashers contemporâneos originais, podemos perceber uma nostalgia que é trabalhada de modo mais inventivo.
Corrente do Mal (2015), por exemplo, tem um estilo que lembra o de John Carpenter enquanto sua premissa remete ao contexto histórico dos slasher dos anos 80 (principalmente na relação entre a AIDS e a punição moral dos filmes). Nesse caso, o diretor não apenas copia uma fórmula, mas dá um novo rumo às convenções.
Os Estranhos (2008) é um filme que lida com a violência de forma mais direta. E como em alguns slashers clássicos, o longa ignora até mesmo uma possível motivação por parte dos assassinos.
Rua do Medo: 1994 – Parte 1 (2021) também entra nessa tendência nostálgica do terror. Embora até proponha referências interessantes, a obra é incapaz de criar uma boa mitologia própria.
.
AS FASES DO SLASHER
Seguindo algumas ideias de Sotiris Petridis, o cinema slasher pode ser dividido em três fases.
A fase clássica vai dos anos 70 aos anos 80. Nos anos 90, surge uma fase pós-moderna ou autorreferencial. E a partir dos anos 2000, o slasher entra em uma fase nostálgica.
Atualmente, se pensarmos em obras como Pânico (2022), ou ainda na nova trilogia Halloween, o slasher ainda parece sofrer efeitos das fases pós-moderna e nostálgica.
São trabalhos que propõem, ao mesmo tempo, uma desconstrução e uma reverência. Em alguns casos, os cineastas conseguem apresentar novas possibilidades para o imaginário dessas franquias enquanto que, em outros, os filmes soam meramente calculados.