TOP GUN: MAVERICK (2022): Renovação e nostalgia

Joseph Kosinski atualiza a franquia com um equilíbrio certeiro entre romantismo e agilidade

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Pete “Maverick” Mitchell, o protagonista de Top Gun: Ases Indomáveis (1986), é chamado para treinar uma turma na academia Top Gun. Além de enfrentar a tarefa de encontrar um piloto tão bom quanto ele, Maverick se depara com os desafios de um contexto militar mais ágil e tecnológico.

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Top Gun: Maverick (2022) apresenta um equilíbrio quase perfeito entre nostalgia e renovação. É uma obra que harmoniza muito bem as tendências ingênuas e românticas do filme de 1986 com a objetividade e praticidade de um cinema contemporâneo de ação. Uma objetividade e praticidade que rementem, principalmente, aos últimos filmes da franquia Missão: Impossível dirigidos por Christopher McQuarrie.

A presença do avatar de si mesmo da alta performance que Tom Cruise desenvolveu nos últimos anos e o envolvimento do próprio Christopher McQuarrie na produção e no roteiro do longa com certeza foram elementos essenciais nessa equação.

O grande feito de Joseph Kosinski, nesse sentido, foi fazer um filme em que a ação soa muito contemporânea e dinâmica ao mesmo tempo em que existe uma evocação romântica clássica por certas imagens icônicas e nostálgicas como a moto, a estrada ou mesmo o par romântico idílico.

Um aspecto contemplativo e sentimental que o cineasta, de algum modo, já tinha trabalhado muito bem em Oblivion (2013). Mesmo esse distanciamento que a temática futurista dos seus outros filmes possui de certo modo é trabalhado aqui como um distanciamento lírico nessa temática nostálgica: o personagem de Tom Cruise não é um homem que vive no presente, é um viajante do tempo que chega de moto direto de um filme de 1986.

É uma obra que se por um lado atualiza esse apelo de uma ação mais agressiva e que sempre se renova nos obstáculos que apresenta (até mesmo as complicações e resoluções inusitadas do ato final seguem muito o estilo dos filmes de Christopher McQuarrie), por outro o longa me remete até mesmo ao James Cameron pelo modo que faz uma cena simples entre um casal soar épica. Ou pelo modo que transforma todos os diálogos em um pequeno acontecimento que merece nosso interesse.

Inclusive, é um filme extremamente afiado na maneira em que lida com os seus diálogos e situações circunstanciais. Apesar de ser longo, nada soa excessivo e cada frase surge com um timing que fica entre um cinismo aceitável (não é aquela dinâmica chata dos personagens ficarem mostrando que são mais espertos que a audiência) e um drama que nunca passa do ponto.

Isso soa até mesmo como algo que o diretor usa para controlar melhor algumas atuações. Ele sabe até que ponto Tom Cruise fazendo um drama pode dar certo e sempre corta antes de tudo parar de funcionar. Os momentos entre Cruise e o personagem de Miles Teller até poderiam ir para um lado mais enfadonho, mas é tudo muito preciso e até calculado dentro de uma certa tolerância para que a audiência entenda, se emocione, mas não seja chantageada emocionalmente.

No fim das contas é um filme com um rigor que remete a uma fórmula mais clássica de blockbuster justamente por se focar em uma eficiência específica do que tem a sua disposição e não em uma tentativa de reinventar as coisas. O diretor e produtores entendem muito bem o que tem em mãos, sabem até que ponto podem tornar as coisas mais ou menos complexas para o seu espectador e tendem a se basear mais em resoluções estimulantes e práticas do que em dramas complexos

Mesmo o fato da missão, no plot do filme, possuir um inimigo sem nome que existe apenas em uma tela, e nunca em um núcleo de antagonistas concretos, reforça esse minimalismo da fórmula clássica de um blockbuster high concept.

O que importa é muito mais a evidência de que existe um mal que deve ser exterminado – um tubarão gigante, um ditador estelar com uma máscara, um caminhoneiro que persegue um pai de família na estrada, um demônio no corpo de uma garota de 12 anos (para ficarmos em algumas comparações com outros clássicos high concept) – do que a compressão exata desse mal.

Todo o mote narrativo – e consequentemente a celebração americanista da obra – está contida muito mais nessa jornada de extermínio do que em qualquer possibilidade de compreensão direta do inimigo.

O drama Cruise x Teller só é resolvido no campo de batalha. É preciso a presença desse mal sem um rosto para reforçar a jornada universal de superação pessoal e a celebração do bem como um elemento que, mesmo desprovido das melhores armas (oportunamente os personagens perdem os caças modernosos no embate final) possuem uma vantagem divina individualizada (“Its not the plane, it’s the pilot“). Ou ainda, como diria Serge Daney, é preciso exorcizar o outro para se tornar ainda mais americano.

Top Gun: Maverick é dos poucos filmes lançados nos últimos 10 anos que de fato entendeu esse conceito básico do blockbuster ao mesmo tempo que renovou os seus apelos práticos. Talvez Águas Rasas (2016), do mesmo modo, tenha chegado bem perto. O que mais do que explica o merecido sucesso comercial do trabalho.

Até acho que um diretor como McG entendeu isso no começo do século – e que o próprio McQuarrie talvez trabalhe com esses modelos a partir de uma desconstrução mais pessoal – porém Joseph Kosinski de fato busca uma comoção coletiva e um imediatismo dramático no mesmo nível de James Cameron. O que faz com que seu filme já tenha um lugar garantido na história.