O HOMEM DO NORTE (2022): Blockbuster sensorial

Robert Eggers repensa as tradições do filme épico através de uma abordagem sensorial

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O rei Aurvandill, pai do jovem príncipe Amleth, é assassinado pelo próprio irmão. Depois de 20 anos, Amleth se torna um viking em busca de vingança.

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O Homem do Norte (2022) funciona menos quando tenta ser um drama shakespeariano denso e mais quando se assume como um filme de fã de black metal. Além da história épica, da caracterização muito específica e das atuações melodramáticas, o vilão vivido por Claes Bang possui uma persona que, curiosamente, remete a figura de Varg Vikernes.

É um longa que, no geral, lembra muito O Cavaleiro Verde (2021) não só pela estilização e pelos elementos temáticos semelhantes, mas em como a dimensão fantasiosa intervém de modo muito aberto na narrativa e sempre redefine os seus rumos. São dois filmes que, em teoria, remetem a alguns blockbusters históricos dos anos 90 pela temática épica e por uma certa dinâmica teatral nas cenas, mas na prática nunca se entregam a uma eficiência mainstream.

Enquanto filmes como Coração Valente (1995), ou mesmo algumas obras de Ridley Scott, se apropriam de um imaginário épico para explorar um lado mais prático e físico daquele contexto, David Lowery e Robert Eggers usam o seu interesse por uma abordagem sensorial para propor um olhar místico sobre os imaginários que se debruçam.

Ao mesmo tempo que os dois cineastas tentam ser fiéis a aspectos específicos da caracterização daqueles mundos, eles também se dão várias liberdades no modo em que repensam o arsenal estético das premissas dos seus filmes.

O Cavaleiro Verde (2021) e O Homem do Norte (2022) são longas que talvez não sejam perfeitos no modo em que se resolvem no drama mais direto entre os personagens, porém suprem tudo muito bem no momento em que se mostram submissos aos impulsos psicológicos e esotéricos desses mundos, no momento em que não tem medo de usar um CGI com cara de CGI ou de construir cenários que parecem que saíram direto de um jogo medieval de Playstation para explorar a relação entre os atores e um espaço gráfico maleável.

Os diretores não estão preocupados com uma caracterização verossímil ou uma dinâmica realista e deixam o imaginário onírico das histórias guiar a construção estética dos seus projetos de modo muito aberto

Talvez O Homem do Norte seja até mais interessante pelo modo que lida com a ação, já que trabalha muito bem com uma relação entre aspectos físicos e virtuais nas sequências de lutas. A cena em que o protagonista luta com o defunto pra conseguir a espada e a fatídica cena final que parece ter saído de um peplum em CGI de George Lucas ou de Paul WS Anderson são ótimo exemplos.

Mesmo que alguns aspectos do tom solene da atuação no filme não funcionem, eu gosto do fato do diretor não tentar resolver isso de uma forma contida ou segura. Não é qualquer um que, em pleno 2022, faz um filme com um bando de homem louco gritando em um transe animalesco sem qualquer cerimônia.

Se por um lado o rótulo do que é supostamente chamado de pós-horror vem com esse carimbo de um cinema falsamente audacioso, alguns dos diretores ligados a essa tendência (como os próprios Lowery e Eggers) vem mostrando que não estão mais em sintonia estética com ela, já que essa estilização virtual e o tom geral dessas obras vai contra uma verossimilhança e realismo sóbrio que é das marcas da A24. E mesmo em termos de premissas dramáticas, os realizador buscam uma temática mais universal e clássica.