O BECO DO PESADELO (2021): Eficiência impessoal

Apesar da ótima caracterização, o filme segue a fórmula previsível de seu diretor

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O Beco do Pesadelo é a segunda adaptação para o cinema do romance Nightmare Alley, de William Lindsay Gresham. Em 1947, a obra foi adaptada para um filme noir do mesmo nome.

O filme conta a história de Stanton Carlisle, um homem que começa a trabalhar em uma feira de variedades no final dos anos 30 e se envolve com Molly, uma jovem que apresenta um show envolvendo descargas elétricas. A partir das lições que Stanton aprende observando um casal de videntes que trabalham na mesma feira, ele e Molly montam um show próprio e fazem sucesso ao redor do país.

De modo geral, podemos dizer que O Beco do Pesadelo renega a herança noir da sua adaptação anterior. Ou, pelo menos, podemos afirmar que o filme de Guillermo del Toro não lida com essa herança de forma tão óbvia, já que está mais interessado em deixar tudo esteticamente mais evidente, tudo mais às claras, do que exatamente misterioso.

É claro que existe um mistério envolvendo toda a ambientação da história, ainda mais no modo como o trabalho flerta com alguns aspectos do suspense, mas no geral o filme chama muito atenção pela sua caracterização chamativa.

Nesse sentido, del Toro lida com aspectos nostálgicos de modo instigante. Muito do que, em filmes de outros diretores, seria uma caracterização genérica, aqui adquire uma construção de época bastante minuciosa. Principalmente na forma em que a obra trabalha com os detalhes específicos das atrações da feira de variedades na primeira metade.

Além disso, as cenas envolvendo violência também seguem um caminho gráfico menos contido e relativamente explícito. Algo igualmente presente em A Forma da Água (2017)

A questão é que, para além dessa pegada interessante na caracterização, O Beco do Pesadelo é apenas um filme bem executado. Apesar desse tratamento minucioso com toda a parafernália do seu contexto, o maior problema desse – e, ao meu ver, da grande maioria dos filmes de del Toro – é que são trabalhos que se focam mais em uma eficiência formal e narrativa genérica do que em estabelecer um olhar particular sobre as tradições que se debruçam.

Em última análise, são filmes de cartilha. A fotografia é “bonita”. As atuações são “boas”. A trama “surpreende”, etc. Tudo é baseado em uma aplicabilidade técnica de bom gosto que não é nem muito caricata, mas também nem muito realista. Tudo fica em uma média padrão aceitável – e até oscarizável, para não usar outro termo – que não gera reações muito radicais.

Guillermo del Toro é um diretor que se foca tanto na aparência desse imaginário característico que elegeu para si mesmo que, de certo modo, esquece de propor uma abordagem mais pessoal para além da fisionomia de seus filmes. É um cineasta de fórmula.

Sem dúvida as suas referências são ótimas – contrariando boa parte dos diretores em atividade hoje, ele de fato parece que assiste a filmes – , mas no fim das contas tudo parece parte de um projeto impessoal que só pretende atualizar esses temas para um cinema contemporâneo padrão.

Tecnicamente falando, é uma atualização interessante e cuidadosa. O modo como o cineasta usa a tecnologia, principalmente, reitera elementos de fascínio do gênero fantástico. Mas, ainda assim, o mexicano está longe de propor uma perspectiva individual sobre isso.

São obras visualmente apelativas, mas que sempre deixam uma sensação de vazio. Existe sempre uma frieza no modo em que respondem muito mais a esse “projeto” do que a uma ambição artística específica.